sábado, 28 de julho de 2018

Clítoris: lambidela 7

"A Salomé era um raio de um bicho especial. Nunca conheci nenhuma pussycat como ela. Olhava para uma pessoa, como quem não a vê. Ouvia o que quer que fosse, por mais escabroso que fosse, com aquela expressão de quem está a pensar em fadas e duendes. Aquela cabeça nunca parecia descer à terra. Tinha um coração bom demais, fazia tudo o que estivesse ao seu alcance pelos outros, fosse por quem fosse. Qualquer filho da puta faria dela o que quisesse. Talv...ez o mais próximo que estive de me apaixonar me tenha acontecido quando conheci a Salomé. Longos cabelos pretos, lisos, com uma franja à Cleópatra, uns lábios sumidos e olhos negros, enormes e assustados. Magra em demasia, quase sem mamas, mas com umas longas e belas pernas e um rabo empinado. Inspirava uma tal ternura que tudo o que mais podíamos desejar era tê-la nos braços e protegê-la. Tomei Salomé como uma missão pessoal. Queria dar-lhe as fodas da vida dela. Queria fazê-la vir-se vezes sem fim, queria que, de alguma maneira, saísse de dentro de si mesma, que se libertasse nem eu sabia bem de quê, mas que pressentia existir algures naquele corpo, aprisionando-lhe os sentidos. Dediquei umas semanas a estudá-la. Fazia de tudo para estarmos juntos. Foi assim que, para meu espanto, entre tantas outras coisas, descobri que era enfermeira.
Uma enfermeira, ao contrário de merda de gaivota, não cai do céu. Para se chegar lá, tem de se estudar. Tem de se escolher estudar aquelas coisas. Fígados. Traqueias. Pâncreas. Pilas. Tibiotársica, seja lá essa porra o que for, nem sei bem como se escreve. Estudam essa bosta toda, sabendo que, mais tarde ou mais cedo, vão ter de meter os velhinhos a fazer xixi e cocó. Vão ter de lhes dar banho. Vão ter de fazer mil e uma coisas a pessoas severamente doentes. Quase mil e uma coisas, corrijo. Quase mil e uma coisas delicadas, que mexem com sentimentos. Que obrigam a lidar com dor e sofrimento todos os dias.
Como é que uma gaja boa decide ser enfermeira? Após me pôr a pensar no assunto, cheguei à seguinte conclusão: ou são burras (talvez estúpidas seja mais adequado) ou são seres humanos carentes, que têm uma grande vontade de ser úteis ao próximo. De o servir. De o acarinhar. São mulheres com uma enorme vontade de se entregarem. Escolheram ser enfermeiras. É justo. Poderiam, pelas mesmíssimas razões, ter sido putas."


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